Swing sai do armário

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Uma Noite de Swing no Rio de Janeiro

Numa sala à meia-luz, um sofá em L. Apesar da pouca iluminação, pode-se ver tudo. Tudo. Nesse instante, apenas um casal transa no sofá.

E apenas eu assisto, encostado na parede, a uma distância de menos de três metros, com um enorme ar de indiferença.

A morena corpo perfeito, não mais que 30 anos está por cima, de frente para mim. O rapaz, vinte-e-poucos, está embaixo, deitado no sofá e segurando-a pela cintura.

De repente, entra uma loura, alta, na casa dos 30. A morena, sem interromper o que está fazendo, aproveita para perguntar:

Viu meu marido por aí?

Não. Acabo de vir lá de baixo e ele não estava lá. Pelo visto, você está levando um “balão” diz a loura, dando risada.

Pô, ele estava aqui, mas saiu já tem um tempo e sumiu lamenta a morena, em plena atividade.

Um homem que acaba de chegar e ouve apenas metade do diálogo pergunta à morena, apontando para o rapaz.

Mas esse aí não é seu marido?

Já a caminho da porta novamente, a loura se volta e responde, antes de sair:

Não, esse aí é o meu.

Eis o ambiente anárquico que reina em uma casa de swing. Aliás, talvez “anárquico” não seja a melhor palavra. Apesar das cenas que podem parecer inusitadas, engana-se quem acha que esses locais são ambientes sem lei, uma terra de ninguém, um grande faroeste erótico.

A festa, a orgia, a suruba ou como o leitor quiser chamar tem regras. Não se pode simplesmente chegar lá, abrir a calça e sair fazendo o que quiser. “Não seja insistente.

Se alguém, incluindo sua esposa (o), diz não, não pergunte por quê?, pois apesar de tudo ser um swinger significa liberdade de ação e de escolha, tanto para você como para os outros.

Evite qualquer situação que possa fazer os outros se sentirem forçados a fazerem algo”, prega o Manual de Etiqueta do Swinger

Na prática, é assim mesmo que a coisa funciona. Dentro da casa, antes de tentar se somar a qualquer casal ou grupo em atividade, é bom notar que existe uma espécie de código para saber se a chegada de um novo elemento será ou não bem-vinda pelos que já estão no bem-bom.

A aceitação de mais uma pessoa na brincadeira pode ser dada por um olhar de consentimento ou por um gesto. Para chegar sem ser chamado, vale um toque no ombro ou em outra parte neutra do corpo de alguém já envolvido. Se ninguém tirar sua mão, pode ser um sinal verde, mas vá sempre com calma, testando limites.

Eles farão o mesmo quando quiserem algo com você (ou com o seu companheiro ou companheira). O respeito ao outro é um dos grandes alicerces do swing

“É sua primeira vez?”

A quinta-feira é de chuva fina em Copacabana. A casa fica ao lado de um grande hospital, em uma das principais ruas do bairro. Quando vi o endereço na internet, fiquei surpreso.

Passo por ali frequentemente e jamais notei sua existência, tamanha a discrição. Chego sozinho, por volta das 23h, e dou um nome fictício à recepcionista, que logo percebe: “É sua primeira vez?”.

Acho que isso estava escrito na minha cara. Ela, então, me conduz, junto com outro casal, pelos ambientes. A sensação é estranha – algo que me lembra do primeiro dia de escola.

Fazer aquele tour com a recepcionista deixava evidente a todos que eu era debutante por ali. Por um instante, me arrependi de ter admitido ser minha primeira vez.

Provavelmente, poucos notam a minha passagem, mas a sensação é de que todos os olhares caem sobre mim. A moça vai apresentando os ambientes numa velocidade muito menor do que eu desejaria.

No andar inferior, uma pequena pista de dança com vista para um chuveiro, onde os frequentadores podem fazer exibições. Ao lado, um bar e, em volta da pista, mesas.

Não fosse o tal chuveiro, seria uma casa noturna como qualquer outra. O diferencial estava no andar superior, ainda vazio, que só seria aberto à meia-noite.

A escada dá acesso a um longo corredor. A primeira porta é uma pequena saleta com algumas poltronas e um telão onde são exibidos filmes pornôs.

Chego a estranhar o fato de alguém querer assistir a um filme com tanta ação ao vivo. 

Em seguida, duas portas dão para a mesma sala com um grande sofá redondo.

Seguindo pelo corredor, dois quartos normais (assim como o seu e o meu) que podem ser trancados por dentro, uma jaula e mais um quarto com a porta vazada na parte superior que permite ver o que acontece lá dentro através de um espelho no teto. O corredor termina na grande sala do sofá em L. 

Foto: Franklin de Freitas
Foto: Franklin de Freitas

Repartição do sexo

De volta ao andar de baixo, já sem a companhia da recepcionista, tento ficar à vontade. Sento-me, então, no bar. Tudo corre como numa boate qualquer até a meia-noite, quando um casal de strippers aparece na pista e faz uma apresentação.

O barman me contar que muitas vezes os frequentadores se inspiram nos strippers e também resolvem fazer exibições ali mesmo. Mas não é o caso nesse dia. O mais picante que se vê são dois casais que começam a trocar beijos e carícias – sem homossexualismo masculino, que, pelo menos em público, é raro. É hora, então, de subir.

Lá em cima, silêncio e escuridão. A música não mais se ouve e a iluminação é escassa. “Será que ainda não abriu?”, penso. Mas a impressão de vazio acaba ao entrar na sala do sofá redondo. Lotada por cerca de duas dezenas de pessoas, com gente parada na porta, a sala é o epicentro do encontro. Apesar da grande atividade, no entanto, tudo o que se ouve são gemidos e tudo o que se vê são silhuetas. Alguns, por falta de espaço no sofá ou por um menor impulso exibicionista, trocam carícias em pé, junto às paredes. Uma morena ocupa o centro das atenções: de quatro, ela está no meio do tal sofá, com um homem por trás, e outro, em quem faz sexo oral, na frente. Depois de cinco minutos catatônico, lembro que há mais ambientes a conhecer. Sigo, então, pelo corredor. 

Os quartos e a jaula ainda estão vazios. Na última sala, uma morena alta – que logo reconheço como a que havia feito o tour da recepcionista comigo no começo da noite – rebola, nua, em pé, no sofá, enquanto três homens acariciam seu corpo. O seu parceiro apenas assiste, no canto. Não consigo identificar prazer ou ciúmes no rosto dele. 

Mais tarde, essa mesma morena ocuparia o lugar de destaque no sofá redondo. E aquela que lá estava se perderia em meio a outros corpos. 

Aos poucos, aquela confusão de sombras, gemidos e cheiros vai deixando de ser estranha e passa a ser excitante. Aos poucos, tudo também passa a ser bastante burocrático – grande parte do prazer de uma carta está em abrir seu envelope.

Aquele festival de corpos nus e ofegantes tem um quê de animalesco, mas tedioso. Às 3h da manhã, os casais começam a ir embora. Cada um para seu quarto.

De tabu a moda

Para a maioria dos casais, porém, a graça é ver o parceiro(a) com outra(o). O exibicionismo e o voyeurismo são dois dos principais atrativos no swing

Alguns estudiosos apontam a rotina sexual em que o casal cai depois de um tempo de casamento como um fator motivador para a busca por novas práticas; outros sugerem que as experiências sexuais prévias ao casamento podem ser relevantes na decisão de aderir ao swing.

Mas o terapeuta de casal Sérgio Garbati vai contra a ideia de que o swing é uma prática revolucionária em matéria de relacionamentos. “O swing é uma fantasia.

Os casais que praticam não o consideram uma infidelidade. São apenas novas formas de fidelidade em que se repetem relações de poder já antigas no casamento”, analisa.

“Se no passado, o homem decidia quando a mulher ia sair e quando ela ia ficar em casa; agora, ele decide com quem ela vai transar. Então, isso não indica um avanço, mas, de certa forma, um retrocesso à estrutura antiga de a mulher ser objeto do homem”.

Em The Lifestyle: A look at the erotic rites of swingers (O estilo de vida: um olhar sobre os ritos eróticos dos swingers, 2000, sem tradução), o jornalista americano Terry Gould traça algumas hipóteses para o aumento da prática do swing, entre elas o crescimento do papel social, econômico e sexual da mulher, a melhoria dos meios de comunicação eletrônicos para o contato entre os swingers e a mudança de visão nos EUA sobre práticas sexuais não convencionais.

Garbati é mais cauteloso: “Não se pode afirmar que a prática do swing tenha aumentado, mas sim que ela tem tido mais visibilidade.

Os comentários hoje extrapolam as paredes dos consultórios. Talvez a hipocrisia com relação ao tema tenha diminuído”, sugere.

Como o consenso sobre o assunto parece distante, não importa o que você pretende: quebrar um tabu, aderir a uma moda, realizar uma fantasia ou tentar dar uma apimentada na relação – ou tudo isso ao mesmo tempo.

Diante da incerteza, nada melhor do que um lema dos swingers para guiar a sua decisão: “tudo é permitido, mas nada é obrigatório”.

Foto em destaque: Pedro Correia

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